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Torcida do Fluminense deu um espetáculo de festa e incentivo na arquibancada do Maracanã (Foto: Bruno Leonardo) |
Eu costumava
participar de um fórum de tricolores muito animado, hoje extinto, chamado Mural
Tricolor, numa época em que fóruns de discussão cumpriam um papel importante de
interação entre torcedores, que acabou sendo absorvido pelas redes sociais.
E no Mural
havia um integrante muito participativo, codinome Preguinho, que gostava de
asseverar: “eu não gosto de futebol, eu gosto é do Fluminense”.
Nesses tempos
estranhos em que se pratica no Brasil um esporte parecido com futebol e o
presidente da CBF é um foragido da justiça suíça, a máxima do querido Preguinho
fake é mais atual do que nunca.
Não é mais
possível ser um amante do futebol brasileiro, simplesmente porque o que
conhecíamos por futebol brasileiro foi trocado por uma mistura de jogo feio com
canalhice. E nessa mistura o Fluminense tem dançado muito mais do que tem sido
ajudado.
O lance
capital da partida de ontem foi uma pantomima. Após converter o pênalti por ele
mesmo cavado, em um lance no qual se atirou na área, esticando a perna esquerda
para trançá-la com a perna de Gum e fazer parecer que foi derrubado, Zé Roberto
ergueu a mãos aos céus e agradeceu a Deus, como se Deus tivesse parte nesse
engodo de quinta categoria.
Ontem à noite
e ao longo do dia de hoje a discussão vai ficar centrada no pênalti
pateticamente cavado. O problema é que, se concentrarmos a análise no pênalti,
e não no padrão de arbitragem praticado pelo Sr. Leandro Vuaden, o
pronunciamento do presidente Peter (exemplar, por sinal) ficará parecendo mero piti.
Um olhar mais
atento há de verificar que o Palmeiras praticou o dobro de faltas, mas quem
ficou com mais do que o dobro de cartões amarelos (5 a 2) foi o Fluminense. Que faltas foram
marcadas a favor do Fluminense em lances nos quais a lei da vantagem poderia
ser aplicada, interrompendo contra-ataques. Faltas e laterais foram invertidos.
Faltinhas eram marcadas a todo momento para picotar o jogo. Fora a trapalhada de confundir Breno Lopes com Wellington Silva na hora de aplicar cartão amarelo.
Todos esses
detalhes serão encobertos por dois discursos preguiçosos que estão em voga e
servem para desviar o foco: 1) o revoltado de hoje foi o beneficiado de ontem,
e quando beneficiado, calou-se. 2) A arbitragem é calamitosa e erra muito, mas
erra para todos os lados. O 1º discurso joga a culpa sobre a vítima do apito, como
se tudo não passasse de indignação seletiva e não houvesse urgência em melhor o
nível da arbitragem. O 2º discurso se esquece que, se a arbitragem erra contra
todos os clubes, erra mais contra uns do que contra outros, e em favor de
alguns poucos, ainda conserta o erro com a interferência de um observador externo.
Ou seja, não
há isonomia no erro. Nem esse suposto equilíbrio na distribuição dos erros. O
Fluminense que o diga.
Arbitragem à
parte, a noite de ontem serviu para deixar o coração desse blogueiro em paz.
Primeiro com
a torcida, que compareceu, cantou e apoiou o tempo inteiro, provando ao GEPE que
os temores relativos às bandeiras e ao pó de arroz eram completamente
infundados. Fizemos uma festa que transcendeu o futebol. Eu vi um gesto que
estava caindo em desuso no Maracanã: estranhos se abraçando espontaneamente nas
comemorações de gol. A alegria que pulsava das arquibancadas transcendia o amor
pelo Fluminense. Eu vi pessoas emanando generosidade pelo próximo e um amor à
vida a cada sorriso, a cada abraço, como se por alguns breves minutos fôssemos
capazes de ser uma humanidade muito melhor.
Aqui abro um
parêntese: vou me abster de empreender um discurso contra os que não foram. Que
cada um faça, como cidadão tricolor, seu exame de consciência. Mas quando se
concentra a culpa sobre o torcedor, o clube se exime do trabalho de aperfeiçoar
as estratégias para atraí-lo. A experiência comprova que chamar o torcedor aos
brios rende discursos muito bonitos, mas pouco eficazes no sentido de elevar a
média de público.
Meu coração
também ficou em paz com o time. Ainda que esta paz seja temporária e sujeita a
mudança de humor nos tropeços do campeonato brasileiro. Como é bom ver o
Fluminense fazer dois gols de jogada ensaiada. Como é gratificante ver Marcos
Júnior e Scarpa balançarem as redes e ouvir o “Uh, vem que tem” sair a plenos
pulmões das arquibancadas, mudando o paradigma de uma torcida que até pouco
tempo atrás só colocava fé nos medalhões da Unimed e enxergava Xerém como
quebra-galho. Mais do que tudo, fico contente de ver que à garra e disposição
para buscar a vitória, foram adicionados progressos táticos.
Foi
auspicioso ver que a temida bola aérea do Palmeiras foi neutralizada pelos
treinamentos específicos de Eduardo Baptista. Ainda precisamos resolver a saída
de bola quando ela fica a cargo de Gum e os adversários correm pra cima dele
pra forçar uma rifada ou passe errado, comprometendo nossa transição. Voltamos
para o 2º tempo adotando o costumeiro expediente de recuar, marcar muito atrás
e partir em contra-ataques.
Dessa vez,
porém, encontramos desafogos que antes não encontrávamos. Scarpa, em noite
inspirada, e Vinicius, ainda se ressentindo de melhor condição física, verticalizaram
passes e encontraram, respectivamente, Magno Alves e Marcos Júnior em condições
excelentes para finalização. No primeiro lance, equívoco grave do Magnata, que
deveria chutar a gol em vez de assistir o Resolve, à frente da linha da bola.
No outro lance, erro de Marcos Júnior em dominar e chutar rasteiro, quando o
lance pedia um toquinho por elevação. Gerson, constante alvo de minhas críticas, entrou muito bem no jogo, e participou de uma das chances de gol criadas pelo Flu ao acionar Magno Alves na direita, após conclusão que tinha endereço certo e foi desviada.
Uma análise
tática mais cuidadosa eu ficarei devendo porque fui traído pela grade de
programação da NET. Programei o aparelho para gravar um VT que passaria às
cinco da madrugada e quando acordo, descubro que em vez da reprise do jogo o
Sportv transmitiu um documentário sobre Pelé. No estádio não reúno frieza para
fazer análises táticas. Como qualquer torcedor, me concentro em emanar
vibrações para que a bola entre na rede do adversário.
Concluo este
texto já com a notícia de que Fred não teve lesão grave e joga a partida de volta.
A notícia robusteceu meu otimismo quanto a nossas chances de classificação. Não
há ninguém no adversário que se assemelhe a Fred no que tange a sua liderança
dentro de campo e sua inteligência para ler o jogo. O capitão participou
ativamente dos 2 gols, com uma cabeçada e um corta-luz, e foi destaque da
partida.
Sua saída, no
intervalo de jogo, deixou evidente uma coisa: com Fred, o Fluminense é mais
soberano dentro de campo. Não importam quais sejam seus defeitos como
jogador. O Fluminense não se resume a Fred, mas dele se utiliza para traduzir
sua grandeza. Também de Fred se utiliza para expiar suas dores. É a Fred que
escolhem perseguir quando querem alvejar o Fluminense. Não pode haver maior
prova de identificação entre um clube e um jogador, para o bem e para o mal.
Felizmente,
muito mais para o bem. Seja qual for o desfecho do jogo da próxima quarta, uma
certeza me domina: morreremos de orgulho do Fluminense. O Fluminense é foda.
Tiro Livre:
- Presidente Peter, por um dever de justiça, é preciso que se reconheça que sua entrevista após o jogo representou a postura que sempre esperei de um presidente do Fluminense. Que as hienas da mídia classifiquem como chilique, faniquito, o que for. Diariamente somos convidados a acreditar que o torcedor enxerga chifre em cabeça de burro e pêlo em ovo. Mas nós sabemos que no país das papeletas amarelas, do Ivens Mendes e do Edílson Pereira de Carvalho, principiantes e bons moços acabam sempre chupando dedo.
- Concluo este
texto fazendo uma referência ao Vinicius Toledo, do Explosão Tricolor. O que me
marcou foi que seu sorriso, quando lhe procurei para dar um abraço, foi
totalmente espontâneo. A sua satisfação com aquele fato inesperado também era a
minha. Naquele momento, algumas feridas se fecharam. Diferenças à parte na
forma de conceber o Fluminense, nossa felicidade quando o Tricolor das
Laranjeiras alcança as glórias é exatamente a mesma. No final das
contas, é somente isso que importa.
Por Bruno Leonardo
Bruno, gosto muito da forma como você articula as ideias, porque sinto muito do seu coração na transição entre as linhas do texto. Feliz pelo seu reencontro com o Vinícius Toledo, fazendo as pazes. Mais feliz ainda por saber que tenho a oportunidade de conhecer um cara tão bacana como você! Meu texto de hoje, no NETFLU, seguiu uma linha parecida quanto aos erros, inclusive. O seu foi mais humano, na medida em que relatou a intensidade da paixão que os Fluminense nos causa, independente do momento.
ResponderExcluirST
Paulo Brito
Concordo, o futebol perdeu muito nesses últimos anos, que o dinheiro está falando mas. E a bola em campo já não tem mais tanto sentido. Pq está tudo resolvido nos bastidores.
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